O Poder judiciário do Maranhão realizou o Fórum Fundiário Nacional de debate direito à terra nos dias 27 e 28 de abril (quinta e sexta). O evento é uma iniciativa do Fórum Fundiário Nacional, em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO-ONU), Poder Judiciário do Maranhão por meio da Corregedoria Geral da Justiça (CGJ-MA), e está sendo realizado no Fórum Desembargador Sarney Costa, em São Luís (MA).
A capacitação de integrantes do Sistema de Justiça e agentes dos institutos de terra para a aplicação de diretrizes de governança responsável e, consequentemente, o desenvolvimento sustentável das comunidades, é o objetivo central do seminário. Para elucidar essa ideia, sensibilizar esse público e a sociedade em geral para o tema, o primeiro dia do evento reuniu autoridades que desenvolvem ações no âmbito da regularização fundiária para debater o assunto e compartilhar suas experiências.
PROTEÇÃO DE DIREITOS DE ACESSO À TERRA
O encerramento do evento nessa sexta (28), iniciou com um painel intitulado “Proteção de Direitos de Acesso à Terra, Individuais e Coletivos, Direitos Formais e Consuetudinários”, apresentado pelo consultor das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), Richard Torsiano; e mediado pelo juiz coordenador do Núcleo de Prevenção e Regularização Fundiária (NUPREF) da Corregedoria Geral da Justiça do Tocantins (CGJ/TO), Wellington Magalhães; e pela juíza Adriana Chaves, membro do Comitê de Diversidade do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA).
Durante o painel, o Consultor da ONU resgatou o histórico de dificuldade para promoção de uma ocupação ordenada do território brasileiro, discorreu sobre o conceito de direito consuetudinário e elencou elementos imprescindíveis para a construção de uma nova perspectiva para o Sistema de Justiça, estabelecendo o Judiciário como principal articulador das ferramentas de regularização fundiária e governança responsável. “Não adianta somente desburocratizar uma parte do processo para acelerá-lo, se o Estado não possuir real capacidade de desburocratizar todo o ciclo de reconhecimento dos direitos individuais. É importante que haja capacitação e recursos, do contrário, continuaremos somente no discurso da garantia dos direitos e fomentando conflitos”, comentou.
Ao final do primeiro bloco, foi apresentado um estudo de caso sobre “Experiência de Boas Práticas para Regularização de Comunidades Tradicionais, Indígenas e Quilombolas, Aspectos Técnicos e Jurídicos”, com a participação do assessor técnico em governança do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), Bruno Nascimento; e do assessor do Instituto Internacional de Educação do Brasil (IIEB), André Tomasi.
Bruno Nascimento apresentou o “Tô no Mapa”, um aplicativo de celular desenvolvido para que povos, comunidades tradicionais e agricultores familiares brasileiros realizem o automapeamento de seus territórios. Uma ferramenta acessível e gratuita, construída a partir do diálogo entre diversas comunidades e organizações sociais. Segundo o assessor, com o aplicativo, todo o reconhecimento do território é feito de forma coletiva, respeitando os titulares legítimos e seus direitos de posse. “Dessa forma, fortalecemos a participação e protagonismo das pessoas invisibilizadas e colocadas em situação de vulnerabilidade”, avalia Nascimento.
Até dezembro de 2022, o “Tô no Mapa” já reunia dados de 191 comunidades de territórios tradicionais, e indicavam, por exemplo, que em 36 anos a cobertura do solo nesses territórios teve pouca mudança, com média de 76% de vegetação nativa, contra médias de apenas 50% em áreas não demarcadas. “Existem 3,5 vezes mais comunidades registradas no aplicativo, se compararmos aos dados de registro do IBGE, FUNAI ou Fundação Palmares do Cerrado”, detalhou o representante do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN).
O assessor do Instituto Internacional de Educação do Brasil (IIEB), André Tomasi, apresentou boas práticas realizadas a partir da regularização fundiária desenvolvida junto aos povos e comunidades tradicionais no Sul do Amazonas e na região Médio Rio Solimões. Detalhou as linhas gerais de atuação do IIEB, com foco na capacitação e formação, gestão territorial, ambiental e financeira, além do fortalecimento institucional nessas áreas. “Até 2018 com o programa terra legal, conseguimos desenvolver em parceria com a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e outros órgãos, a regularização fundiária das áreas de várzea dos rios federais, aqueles que cortam vários estados e até outros países até chegar ao Brasil”, pontuou.
O programa tinha três objetivos principais: definir a destinação de áreas públicas federais na Amazônia, emitir títulos de propriedade para regularizar a situação de pequenos posseiros na região e fazer um mutirão de georreferenciamento das glebas. Tomasi também explicou que com a paralisação de programas dessa natureza no período do último Governo Federal, foi necessário criar formas inovadoras para levar dignidade à população das áreas amazônicas, desenvolvidas em parceria com os governos estaduais, em especial o do Estado do Amazonas. “Foi aí que nasceram os TUC´s, Territórios de Uso Comum na Lei de Terras do Estado do Amazonas, que possibilitaram a criação de espaços territoriais especialmente protegidos, garantidos por Lei Ordinária estadual”, detalhou.
Os TUC´s se traduzem na concessão do Direito Real de Concessão do Uso, que pode ser realizada na modalidade coletiva e com prazo indeterminado, quando se destina à regularização fundiária coletiva de povos e comunidades tradicionais em terras de domínio público estadual. O assessor também destacou que há uma grande expectativa para a retomada dos projetos de regularização fundiária nessas áreas a partir de ações do novo Governo Federal.
CENÁRIO SOCIAL E RELEVÂNCIA DA AÇÃO
A exposição dos temas e a construção do debate principalmente sobre a regularização fundiária no contexto da Amazônia Legal trazem à tona o assunto latente no Maranhão e no Brasil sobre a violação aos direitos dos povos quilombolas sobre a terra. Esse cenário reflete a pertinência da abordagem à qual o evento se dedica e a importância da capacitação de quem trabalha diretamente com regulamentação fundiária, não somente em relação aos critérios técnicos, mas também no sentido da promoção da Justiça e da cidadania e na busca de maneiras para solucionar os problemas como vulnerabilidade fundiária e insegurança jurídica.
Nesse sentido, a Corregedoria Geral da Justiça do Maranhão (CGJ/MA) vem desenvolvendo projetos em completa consonância com a atualidade, dedicados a ampliar o acesso à justiça e promover a cidadania, entre esses projetos, destaca-se o “Registro Para Todos”, que somente durante a atual gestão já realizou cerca de 12 mil registros de propriedade em todo o estado.
Fonte: Assessoria Corregedoria Geral da Justiça
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