Fundada em 2015, a Guaaja foi a primeira unidade formalizada de produção de tiquira no Maranhão. O diferencial está na destilação artesanal, que garante a qualidade da bebida ao separar o álcool dos outros componentes, preservando sua pureza e identidade sensorial.
Transformar uma tradição secular em um empreendimento inovador foi o caminho trilhado pela ex-advogada, Margot Stinglwagner — 55 anos — empreendedora que apostou na força cultural da tiquira para construir um negócio de alcance internacional. À frente da destilaria Guaaja, instalada em Santo Amaro (MA), ela participa de todas as etapas do processo produtivo — da escolha dos insumos à distribuição da bebida.
Logo nas primeiras horas do dia, a mandioca, principal matéria-prima, passa pelo cozimento. É nesse momento que ocorre a transformação enzimática: o amido da raiz é convertido em açúcar, que segue para as etapas de fermentação e destilação.
Galeria rede social – Guaaja
Fundada em 2015, a Guaaja foi a primeira unidade formalizada de produção de tiquira no Maranhão. O diferencial está na destilação artesanal, que garante a qualidade da bebida ao separar o álcool dos outros componentes, preservando sua pureza e identidade sensorial. Parte da produção descansa em barris de madeira; a outra segue para tanques de inox até o engarrafamento.
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Apesar de a mandioca ser essencial ao processo, a destilaria não mantém plantio próprio. A matéria-prima é adquirida de agricultores locais e de municípios vizinhos, estimulando a economia regional e reduzindo impactos ambientais. Essa cadeia produtiva gera renda para dezenas de famílias.
A sustentabilidade é um dos pilares do modelo de gestão adotado por Margot. Todos os resíduos do processo produtivo são reaproveitados, seja como ração para pequenos criadores ou como adubo para a agricultura familiar.
“Começamos entregando a massa para quatro famílias que criavam animais. Hoje, o número cresceu tanto que nem conseguimos mais contar”, relembra.
Da cozinha ao mundo
O início da trajetória foi modesto. A paixão pela tiquira começou na cozinha da própria casa, no Rio de Janeiro.
“Fazia experiências por curiosidade e encantamento. Quando experimentei a tiquira, fiquei fascinada com o sabor e a originalidade. Com o tempo, percebi que poderia transformar isso em um negócio profissional”,
disse a empresária.
Determinada, Margot mudou-se para o Maranhão — berço da tiquira — e, com o apoio do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Maranhão (Sebrae-MA), investiu em equipamentos, desenvolveu técnicas e formalizou a empresa.
“O Sebrae foi fundamental. Me ajudou a estruturar o projeto, entender os processos e gerir o negócio com mais eficiência.”
Segundo o Sebrae-MA, as mulheres representam 43,1% dos empreendedores no estado. Apesar da presença feminina ser maior no comércio e nos serviços, no setor industrial elas ainda somam apenas 6,12%. Mas esse cenário vem mudando, impulsionado por histórias como a de Margot.
Fundada em 2012 e formalizada em 2015, a Guaaja nasceu com a missão de valorizar a tiquira — um destilado ancestral, 100% brasileiro — e consolidar o Maranhão como referência internacional no segmento.
Enfrentando um setor majoritariamente masculino, Margot rompeu barreiras e colocou a tiquira no mapa das bebidas de excelência.
“Sempre quis mostrar que a tiquira pode ser apreciada como qualquer outro destilado de qualidade.”
Em 2015, ela apostou alto: ampliou a produção com alambiques maiores e investiu em tecnologia, mirando novos mercados e clientes.
Suporte ao empreendedorismo
O apoio oferecido a Margot não foi um caso isolado. O Sebrae-MA disponibiliza capacitações, consultorias e orientações técnicas para empreendedores em diferentes estágios. As consultorias — muitas subsidiadas ou gratuitas — abrangem finanças, gestão estratégica, marketing digital, formalização e acesso a crédito.
Reconhecimento Internacional
A Guaaja acumula mais de 16 premiações, muitas delas conquistadas em concursos internacionais. Hoje, a bebida é comercializada em vários estados do Brasil e começa a ganhar espaço no exterior.
“Essas premiações lavam a alma. Larguei tudo no Rio para me dedicar à tiquira e preservar essa tradição. Quando ganhamos prêmios em Nova York, São Francisco, Hong Kong… foi como um abraço do mundo. E quando a tiquira foi reconhecida como patrimônio do Maranhão, ali sim, senti que a luta valeu a pena. Foi uma vitória minha — e da cultura maranhense.”
Margot Stinglwagner
O setor de cachaça no Brasil segue em expansão. De acordo com o Anuário da Cachaça 2025, do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), em 2024 o país registrou 1.266 estabelecimentos, 49 a mais que no ano anterior. O Maranhão ocupa a 17ª posição nacional, com um produtor para cada 701 mil habitantes.
Anuário da Cachaça 2025- Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa)
Em 2023, a tiquira foi reconhecida oficialmente como Patrimônio Cultural Imaterial do Maranhão, durante o Festival Maranhense da Cachaça, Cultura & Sabores, realizado em São Luís. O título valoriza o modo artesanal de produção e os saberes ancestrais preservados ao longo de gerações.
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Diversidade de sabores
Guaaja apresenta quatro versões da bebida:
Tiquero, de coloração roxa natural, com aroma de jasmim e toque de pêra asiática.
Tradicional (ou Prata), a tiquira em sua forma mais pura, sem envelhecimento, estampada com guarás no rótulo.
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Pintada e Carcará, armazenadas por 12 meses em barris de umburana e carvalho, com notas amadeiradas e coloração diferenciada.
Quem aprova
Jessica Sanches, mixologista e consultora de bares, destaca o valor de produtos brasileiros como a tiquira.
O chef canadense, Normand Laprise também se rendeu à originalidade da bebida.
Já o sommelier de cachaças Júlio César Barbosa aponta a sofisticação do destilado.
“A Tiquira Guaaja tem pureza, aroma marcante, notas defumadas e um retrogosto que lembra especiarias. Agrada tanto iniciantes quanto experts.”
Mais do que um produto, a tiquira carrega história. Derivada do cauim indígena e com registros datando de 1855, seu nome vem do tupi ti-kyra, “líquido que goteja”.