Como você se nutre? A forma como respondemos a essa questão reflete nosso conhecimento sobre o processo de amadurecimento do ser humano, o desenvolvimento das doenças e a importância da nutrição como agente construtor de uma boa saúde. E mais: como está nosso autocuidado e nossa autoestima. Afinal, se alimentar ou nutrir de forma adequada está nos fundamentos da boa saúde, da qualidade de vida, da longevidade.
Estudo recente publicado pela revista científica The Lancet Planetary Health atraiu o interesse da imprensa e da classe médica por fazer uma associação direta do consumo de alimentos processados ou ultraprocessados com o maior risco de desenvolvimento de 25 tipos de câncer. E alertou para o fato de que a substituição de 10% da ingestão diária dessas comidas por alimentos in natura e minimamente processados pode reduzir de forma significativa os riscos para diversas doenças. Só 10%. Nos faz pensar, não?
Saúde e equilíbrio andam juntos. Já se sabe há muito tempo, embora nem sempre se pratique. Estudos realizados em um corte de mais de 7.000 pessoas acompanhadas por 10 anos em 13 países europeus, demonstraram que a ausência de bons hábitos de vida esteve associada com 60% de todas as mortes e 61% das mortes por doenças cardiovasculares. Mostraram que faz toda a diferença elaborar um cardápio rico em verduras, vegetais, frutas e pouco açúcar e sal.
Outro estudo importante que avaliou o impacto da alimentação na morbidade e mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis em todo o mundo foi o Global Burden of Disease Study. Ele concluiu que 11 milhões de mortes foram causadas por alimentação inadequada no ano de 2017, principalmente em decorrência de doenças cardiovasculares, câncer ou diabetes tipo 2. Entre os fatores responsáveis pela mortalidade se destacam o alto consumo de sódio e a baixa ingestão de frutas, cereais integrais, hortaliças e oleaginosas. A pesquisa indicou que cerca de 45% das mortes e 70% dos anos de vida sem saúde atingiram pessoas com menos de 70 anos, o que prova que a má nutrição não é assunto somente das populações mais vulneráveis ou dos mais idosos.
Qual a importância de uma alimentação saudável?
Independentemente da idade, é fundamental garantir a ingestão diária adequada de proteínas e oligoelementos por meio não só de uma dieta, mas também via suplementação. Inicialmente, os suplementos alimentares eram indicados para pacientes com ingestão alimentar muito abaixo das necessidades calóricas diárias, idosos com riscos ou pessoas já em estado de desnutrição. Nos últimos anos, no entanto, vem crescendo o consumo destes produtos com o objetivo de recompor dietas deficitárias, que se iniciaram na infância e se agravaram ao longo da vida, particularmente durante a pandemia. Estudos recentes confirmam os benefícios de determinados tipos de suplementos em adultos sem risco nutricional grave, com ganho de massa e função muscular, quando associados a exercícios físicos por um período mínimo de três meses.
Há de se considerar também a saúde intestinal, pois é neste órgão que os nutrientes são processados para depois seguir para os demais órgãos, eliminando apenas o que não tem utilidade nutricional. O intestino é um verdadeiro ecossistema habitado por bilhões de microrganismos que influenciam diversos aspectos da nossa saúde. Além da função digestiva, o microbioma intestinal é capaz de influenciar o sistema imunológico e até mesmo o humor e o comportamento humano – uma relação direta entre o microbioma intestinal e o cérebro, conhecida como eixo intestino-cérebro. Estudos mostram que o microbioma intestinal atua na regulação da saúde mental e emocional, bem como no desenvolvimento de doenças crônicas, como obesidade, diabetes e doenças inflamatórias. Por isso, é tão importante cuidar da saúde intestinal, uma alimentação equilibrada pode ajudar a manter a diversidade e a quantidade de microrganismos benéficos no intestino.
Para mudar nossa expectativa e qualidade de vida, precisamos de uma abordagem mais abrangente da saúde. A doença não deve ser o foco único de nossa atenção. Não podemos pensar em nosso autocuidado e corrigir nossa alimentação apenas quando adoecemos. Além da nutrição alimentar primária, é necessário avaliar ainda a chamada “nutrição secundária”, considerando o que nos chega em termos de emoções, pensamentos e mensagens através dos contatos pessoais e profissionais, pois são eles que constroem nossa saúde emocional. A que tipo de conteúdo cultural, recreacional ou acadêmico estamos abertos e expostos? São através deles que formamos pensamentos, opiniões e hábitos.
Nosso organismo é constituído por trilhões de células que se renovam periodicamente e se formam a partir do que entra através do sistema digestivo, de nossos órgãos do sentido, de nossas emoções, pensamentos e atitudes. Portanto, se a saúde nos habita ou se alguma doença já nos visita, vamos focar na qualidade de nossa nutrição primária e secundária. Se necessário, mudar nosso estilo de vida. Pessoas bem nutridas – inclusive de valores universais – estão mais preparadas fisiologicamente para combater doenças, tem um processo de envelhecimento mais saudável e acrescentam muito mais aos outros em seus relacionamentos.
Complementando a afirmação de Hipócrates, grande pensador e pai da medicina, que disse que “Somos o que comemos”, está cada vez mais claro que no contexto de Longevidade saudável nós somos o que comemos, vivemos e sentimos.
Fonte: Revista Exame