O Exército colombiano pediu nesta terça-feira (03),  pela primeira vez, desculpas às famílias de 19 dos 6.402 civis mortos por soldados, num dos capítulos mais sombrios da história da Colômbia: os assim chamados “falsos positivos”, execuções extrajudiciais de jovens inocentes, cometidas por militares para inflar as vitórias contra a guerrilha das Farc. 

“Reconhecemos que houve atos dolorosos cometidos por membros do Exército Nacional que jamais deveriam ter acontecido”, disse o comandante da força, general Luis Ospina, durante cerimônia em Bogotá.

Os assassinos e seus cúmplices “mancharam a legitimidade” da instituição, acrescentou o militar: “Oferecemos nossas sinceras desculpas e pedimos perdão”, disse, dirigindo-se aos parentes das vítimas. O esquema teria ocorrido entre 2004 e 2008, visando a obtenção de benefícios como dias de folga e condecorações.

Perdão por “ação criminosa” de membros do Exército

Também presente à cerimônia, o ministro da Defesa, Iván Velásquez, garantiu que os pedidos de desculpas eram apresentados não só para cumprir uma ordem judicial, mas “especialmente porque obedece às nossas convicções democráticas”.

“Para honrar suas memórias, para dizer à Colômbia e ao mundo que os 19 jovens cujos familiares e amigos hoje abraçamos com respeito e solidariedade não eram guerrilheiros, não estavam realizando nenhuma ação criminosa, não assumiram nenhum confronto com os militares; eram homens cujas vidas, sonhos e ilusões foram ceifados pela ação criminosa de membros do Exército nacional.”

“Pedimos desculpas por estes crimes que nos envergonham perante o mundo, reconhecemos a responsabilidade do Estado na sua execução”, enfatizou Velásquez. 

Familiares das vítimas agradecem, mas exigem respostas

A cerimônia contou com um público formado em sua maioria por mulheres. Apesar de agradecerem o ato, algumas sublinharam que o pedido de desculpas chega tarde e parte de um governo que nada teve a ver com os acontecimentos.

“Juan Manuel Santos era quem deveria estar presente para nos mostrar seu rosto e pedir perdão”, criticou Florinda Hernández, mãe de Elkin Gustavo Verano Hernández, assassinado em 15 de janeiro de 2008. 

Santos, que como presidente ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 2016 após assinar um acordo de paz com as Farc, foi um dos ministros da Defesa durante os piores anos de execuções extrajudiciais, que coincidiram com o governo de Álvaro Uribe (2002-2010).

“Nossa luta não termina, e seguiremos tentando encontrar os verdadeiros responsáveis ​​e descobrir quem deu a ordem para cometer esses crimes”, prometeu Jackelin Castillo, irmã de Jaime Castillo e presidente das Mães das Vítimas de Falsos Positivos. (Mafapo). 

Jovens eram atraídos com falsas promessas de emprego

Julián Oviedo, Carlos Alberto Redondo, Mario Alexánder Arena, Diego Alberto Tamayo e Omar Leonardo Triana também estavam entre os 19 jovens da cidade de Soacha, vizinha de Bogotá, que foram enganados com falsas promessas de empregos para em seguida ser assassinados e apresentados como guerrilheiros mortos em combate pelo Exército no Norte de Santander.

Desde que vieram à tona os primeiros casos de “falsos positivos”, os comandantes do Exército negaram que se tratasse de uma ação sistemática, chegando a afirmar que se tratava de uma invenção de organizações de esquerda para deslegitimar as forças de segurança.

Mas a Jurisdição Especial para a Paz (JEP), tribunal nascido do acordo de 2016 que desarmou os guerrilheiros das Farc, concluiu em 2021 que pelo menos 6.402 indivíduos morreram dessa maneira.

Fonte: DW Brasil