Peixes consumidos em 6 estados da Amazônia têm contaminação por mercúrio

Um estudo identificou que peixes vendidos em seis estados da Amazônia apresentam níveis de contaminação por mercúrio acima do limite aceitável de 0,5 micrograma por grama, estabelecidos pela Organização para Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO/OMS) e pela Agência de Vigilância Sanitária brasileira (ANVISA)

Essas informações são do um estudo realizado por pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), Greenpeace Brasil, Iepé, Instituto Socioambiental (ISA) e WWF-Brasil e divulgado nesta 3ª feira (30.mai). 

O levantamento buscou avaliar o risco à saúde humana em função do consumo de peixes contaminados e, para isso, visitou mercados e feiras em 17 cidades espelhadas pelos estados de Roraima, Acre, Amapá, Amazonas, Para e Rondônia. São elas: Altamira (PA), Belém (PA), Boa Vista (RR), Humaitá (AM), Itaituba (PA), Macapá (AP), Manaus (AM), Maraã (AM), Oiapoque (AP), Oriximiná (PA), Porto Velho (RO), Rio Branco (AC), Santa Isabel do Rio Negro (AM), Santarém (PA), São Félix do Xingu (PA), São Gabriel da Cachoeira (AM) e Tefé (AM).

Os piores índices estão em Roraima, com 40% de peixes com mercúrio acima do limite recomendado, e Acre, com 35,9%. Enquanto os estados do Amapá e Pará tiveram as menores prevalências, 11,4 e 15,8%, respectivamente.

Dos 1.010 exemplares de peixes analisados, representantes de 80 espécies distintas, somente 197 apresentaram níveis de mercúrio abaixo do limite aceitável ou com níveis de detecção indeterminados. Na média, 21,3% dos peixes comercializados nas localidades e que chegam à mesa das famílias na região têm níveis de mercúrio acima dos limites seguros.

Em todas as camadas populacionais analisadas, a ingestão diária de mercúrio excedeu a dose de referência recomendada. No município mais crítico, de Rio Branco (AC), a potencial ingestão de mercúrio ultrapassou de 6,9 a 31,5 vezes a dose de referência indicada pela Agência de Proteção Ambiental do governo norte-americano (EPA) de 0,1 (0,1 µ/kg pc/dia). No estado de Roraima, a potencial ingestão de mercúrio pela população local extrapolou de 5,9 a 27,2 vezes a dose de referência.

O mercúrio é usado amplamente em diversos garimpos ilegais por toda a Amazônia no processo de separação do ouro de outros materiais. Depois, a substância é despejada no meio ambiente, sem o manejo adequado. Uma vez despejado nos rios, o mercúrio se acumula nos organismos dos peixes e das pessoas que consumirem esses animais. 

De acordo com o Greenpeace Brasil, a substância é neurotóxica, ou seja, provoca graves danos ao sistema nervoso e pode causar perda da visão periférica; dificuldades motoras, na fala, no caminhar e de audição; fraqueza muscular; comprometimento neurológico; coma e óbito. 

Crianças e mulheres

Segundo o estudo, crianças e mulheres são a população mais vulnerável aos efeitos do mercúrio. No estado do Acre, por exemplo, as mulheres em idade fértil estariam ingerindo até 9 vezes mais mercúrio do que a dose preconizada e crianças de 2 a 4 anos até 31 vezes mais. Já no estado de Roraima, as mulheres em idade fértil estariam ingerindo até 8 vezes mais mercúrio do que a dose preconizada, e crianças de 2 a 4 anos até 27 vezes mais.

“Estamos diante de um problema de saúde pública. Sabemos que a contaminação é mais grave para as mulheres grávidas, já que o feto pode sofrer distúrbios neurológicos, danos aos rins e ao sistema cardiovascular. Já as crianças podem apresentar dificuldades motoras e cognitivas, incluindo problemas na fala e no processo de aprendizagem. É urgente a criação de políticas públicas para atender as pessoas já afetadas pela contaminação por mercúrio e medidas preventivas, de controle de uso”, alerta o médico Paulo Basta, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz e um dos coordenadores do estudo.

Como resolver

Diante dos dados classificados como alarmantes, as instituições participantes do estudo publicaram uma nota técnica com uma a série de medidas para acabar com a contaminação dos peixes. A principal recomendação é garantir a erradicação de garimpos ilegais de ouro, bem como desmatamento e queimadas.

“O mercúrio é uma substância de larga permanência, ele fica por décadas nos ambientes e organismos. Por isso, precisamos criar orientações nutricionais de recomendação de alimentação de pescado seguro, as autoridades precisam fiscalizar os garimpos e precisamos fiscalizar, notificar e entender melhor os casos de contaminação por mercúrio. Ainda carecemos de muitos dados e estatísticas oficiais sobre este problema”, pontua Paulo Basta.

Pesquisa

O levantamento foi realizado de março de 2021 a setembro de 2022 e levou em consideração a estimativa de consumo de pescado por pessoa no relatório sobre o consumo de pescado na região amazônica do Brasil, com média per capita de 100 gramas de pescado por dia em ambientes urbanos. Foram avaliados ainda, o cálculo da razão de risco (RR), que indica o potencial de danos à saúde provocado pelo consumo do pescado contaminado e a avaliação de risco à saúde.

Dos 1.010 peixes pesquisados estavam espécies com grande apelo regional, como tambaqui, curimatá, pacu, jaraqui, trairão, tucunaré, pirapitinga e dourada.

Do total geral da amostra, 110 eram peixes herbívoros, 130 detritívoros, 286 onívoros e 484 carnívoros. Os carnívoros apresentaram níveis de contaminação maiores que as espécies não-carnívoras, o índice foi 14 vezes maior.

Fonte: SBT News

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