Os Estados Unidos e o Reino Unido anunciaram neste domingo (23/04) que conseguiram retirar do Sudão os funcionários de suas embaixadas na capital, Cartum, enquanto outros países também tentam ajudar seus diplomatas e cidadãos a fugirem do conflito que assola o país há nove dias consecutivos.
Vários governos europeus anunciaram operações de evacuação neste domingo, em meio aos combates mortais entre generais rivais que lutam pelo controle do terceiro maior país da África.
Batalhas ferozes entre o exército sudanês e um grupo paramilitar – que incluíram combates com tanques na densamente povoada Cartum e ataques aéreos lançados por caças – já mataram mais de 400 pessoas e deixaram milhares de feridos. Os combates continuaram neste domingo, com sons de disparos ecoando em Cartum e aeronaves militares sudanesas rugindo nos céus, disseram testemunhas.
Ao anunciar que os militares americanos “conduziram uma operação” para retirar os funcionários do governo dos EUA do país, o presidente Joe Biden condenou a violência, dizendo que ela é “inconcebível e deve parar”.
Pouco mais de 100 soldados de operações especiais dos EUA participaram do resgate de menos de 100 pessoas, entre funcionários da embaixada e seus familiares. Três helicópteros Chinook voaram de Djibuti, pequeno país no Chifre da África, para Cartum, onde permaneceram em solo por menos de uma hora. Os resgatados foram levados para um local não revelado na Etiópia.
Estima-se que milhares de cidadãos americanos ainda permaneçam no Sudão, incluindo pessoas de dupla nacionalidade.
Mais tarde, foi a vez de o Reino Unido anunciar o resgate de funcionários de sua embaixada. “Forças armadas britânicas completaram uma complexa e rápida evacuação de diplomatas britânicos e suas famílias do Sudão, em meio a uma escalada significante da violência e ameaças aos funcionários da embaixada”, afirmou o primeiro-ministro Rishi Sunak.
Países europeus resgatam civis
Apesar de autoridades dos EUA terem alertado que ainda é muito perigoso realizar operações de resgate de civis em massa coordenadas pelo governo, outros países já lançam esforços para retirar seus cidadãos e diplomatas.
As Forças Armadas da Alemanha (Bundeswehr) deram início às operações de evacuação em Cartum neste domingo, anunciou o Ministério da Defesa do país.
Segundo o jornal Bild, cerca de 100 alemães estavam a bordo de um avião que decolou do Sudão em direção à Jordânia. Dois outros aviões estão se preparando para retirar mais pessoas, segundo a publicação.
“Os ministérios da Defesa e do Exterior estão coordenando juntos uma operação de evacuação em andamento para cidadãos alemães [no Sudão] em consulta com nossos parceiros”, disse a pasta no Twitter. “Nosso objetivo é retirar o maior número possível de cidadãos de Cartum nesta situação perigosa. Na medida do possível, também levaremos cidadãos da UE e outros conosco.”
A missão da União Europeia no Sudão também foi evacuada com segurança no domingo, informou o chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell.
Ele agradeceu em um tuíte o Ministério das Relações Exteriores e o Ministério da Defesa da França por tornar a operação possível, com a ajuda do Djibuti. O embaixador da UE no Sudão continua trabalhando no país do leste africano, acrescentou Borrell. O embaixador foi agredido em sua residência em meio aos confrontos da semana passada.
O Ministério do Exterior da França, por sua vez, afirmou que um avião levando cerca de 100 pessoas deixou Cartum neste domingo em direção a Djibuti, com um segundo avião levando número similar de passegeiros se preparando para decolar, com as operações sendo retomadas nesta segunda-feira.
Já a Holanda está retirando seus cidadãos com ajuda da Jordânia, informou o ministro do Exterior holandês, Wopke Hoekstra, prometendo “fazer o possível para buscar os holandeses o mais rápido e com mais segurança possível”. Mais cedo, o país já havia anunciado que enviou para a Jordânia dois aviões Hércules C-130 da Força Aérea e um Airbus A330 para a operação.
A Itália enviou jatos militares para Djibuti em preparação para o resgate de 140 cidadãos italianos no Sudão, muitos dos quais já se refugiaram na embaixada italiana.
Por sua vez, o ministro do Exterior da Grécia, Nikos Dendias, anunciou o envio de aeronaves e forças especiais ao seu aliado Egito para o resgate de 120 cidadãos gregos e cipriotas em Cartum. Muitos deles buscaram abrigo nos últimos dias em uma catedral ortodoxa grega na capital sudanesa.
O Egito afirmou ter retirado 436 de seus cidadãos dos cerca de 10 mil que vivem no Sudão.
Já a Turquia iniciou as operações de resgate ao amanhecer neste domingo, retirando por terra alguns de seus estimados 600 cidadãos de dois distritos de Cartum e da cidade de Wad Medani, ao sul da capital. Mas os planos foram prejudicados após “explosões” perto de uma mesquita designada como um dos pontos de encontro, disse a embaixada turca no Twitter.
Países asiáticos também iniciaram missões de resgate de seus cidadãos, com Coreia do Sul e Japão enviando aeronaves militares para países aliados próximos.
Aeroportos e rodovias bloqueados
Os combates entre as forças armadas do Sudão e o poderoso grupo paramilitar conhecido como Forças de Apoio Rápido (FAR) tiveram como alvo e paralisaram o principal aeroporto do país, transformando algumas aeronaves civis em ruínas e destruindo pelo menos uma pista.
Outros aeroportos do país também ficaram inoperantes em meio às batalhas.
Viagens por terra através de áreas disputadas pelas partes em conflito também se tornaram perigosas. Cartum fica localizada a cerca de 840 quilômetros do principal porto marítimo do país, Porto Sudão, no Mar Vermelho. Mesmo assim, alguns países arriscaram a jornada.
No sábado, a Arábia Saudita informou que resgatou com sucesso 157 pessoas, incluindo 91 sauditas e cidadãos de outros países.
A televisão estatal saudita divulgou imagens de um grande comboio de pessoas viajando de carro e ônibus de Cartum para Porto Sudão, onde um navio da marinha transportou os resgatados através do Mar Vermelho até o porto de Jeddah, na Arábia Saudita.
O conflito que eclodiu no Sudão
Os confrontos entre paramilitares e forças do governo eclodiram nas ruas da capital, Cartum, em 16 de abril e se estenderam por outras regiões do país africano.
Os combates começaram após meses de tensões entre dois líderes militares rivais. As Forças Armadas do Sudão, sob o comando do general Abdel Fatah al-Burhan, e unidades paramilitares das Forças de Apoio Rápido (FAR), chefiadas pelo vice-presidente do Conselho Soberano, Mohamed Hamdan Dagalo, conhecido como Hemedti, trocaram acusações de provocar o conflito.
Burhan e Hemedti eram antigos aliados que tomaram o poder no Sudão por meio de um golpe em 2021, mas depois caíram em uma amarga luta pelo poder.
Em Cartum, uma cidade de 5 milhões de habitantes, o conflito deixou civis apavorados escondidos dentro de suas casas, com a energia praticamente desligada em meio a um calor sufocante e a internet cortada para a maioria dos residentes.
As batalhas se intensificaram também em outras partes do país. Na região de Darfur, a ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) na cidade de El Fasher disse que seus médicos estão “sobrecarregados” com o número de pacientes feridos por tiros, muitos deles crianças.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) disse que mais de 420 pessoas morreram e mais de 3.700 ficaram feridas nos combates no Sudão, mas acredita-se que o número real de mortos seja ainda maior.
Fonte: DW Brasil